sábado, 21 de março de 2009

PARA A HISTÓRIA DO ENSINO EM MOÇAMBIQUE

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ESCOLAS E ALUNOS DE CABO DELGADO HÁ 150 ANOS:
MATÉRIAS, FREQUÊNCIA, APROVEITAMENTO E PROBLEMAS
Por Carlos Lopes Bento(1)
(Continuação daqui)

III PARTE
Como atrás já foi referido, os habitantes da Vila do Ibo, para além desta Escola de Instrução Primária, ainda, podiam mandar os seus filhos para a Escola Principal de Instrução Primária da Província de Moçambique, que, então, ministrava um ensino de nível mais elevado, frequentado não só por moçambicanos da sua Capital e seu Termo, e dos seus principais Portos da Costa, como também por alunos provenientes de outras cidades da África Oriental e da Ásia.

Foi a mesma criada pelo Decreto de 14.8.1845, que reorganizou o Ensino Primário nas Províncias Ultramarinas Portuguesas.

Dada a sua importância socioeconómica e cultural no contexto da sociedade moçambicana e tendo em consideração o papel que desempenhou na época, merece que sejam divulgados os seus principais traços, que, aliás, vamos encontrar em 2 Relatórios, datados de 1858 e 1859 e um Mapa de 15.4.1960, da responsabilidade do seu Director.

Em 4 de Fevereiro e 7 de Agosto de 1858, o professor responsável pela referenciada Escola Principal, Guilherme Henrique Dias Cardoso, nos seus Relatórios, publicados na folha oficial do Governo Geral de Moçambique, de 20.2.1858 e 14.8.1858, relativos ao 2º Semestre de 1857 e ao 1º Semestre de 1858, dava testemunho do seu funcionamento, frequência, matérias e problemas.

Funcionamento
1857-2º Sem

A escola principal teve o seu andamento e costumada regularidade, tendo lições de manhã e de tarde, segundo as ordens; e os seus alunos, no geral, tiveram, no Semestre, regular conduta, aplicação e aproveitamento.

1858-1º Sem.

A escola principal teve, diariamente, lições de manhã e de tarde, conforme as ordens; e, em tudo o mais, o seu costumado andamento regular, recebendo, matriculando e instruindo todos os alunos que, para esse fim, a ela concorreram.

Frequência
1857-2º Sem

O número de alunos que durante o Semestre frequentou a Escola foi de 63 a 64:

- Existiam, no princípio do Semestre, 64 alunos;
- Entraram de novo 10 alunos, o que perfaz um total de 74;
- Saíram da Escola e tomaram diferentes destinos 10 alunos;
- Faleceu 1; e a
- Existência no 1º de Janeiro do corrente ano era de 63 alunos de todas as diferentes gerações que povoam Moçambique.

1858-1º Sem.

O número máximo de alunos que frequentou a Escola, foi de setenta e seis e a existência actual é de sessenta:
-Tinha no principio de Janeiro sessenta e três alunos;
-Matricularam-se durante o semestre treze, o que fez a supra mencionada totalidade de setenta e seis.
-Saíram, durante o Semestre, dezasseis;
-Existência total, em 30 de Junho era de setenta alunos.(a)

(a)- Dos 13 alunos entrados: 1 era Europeu, 10 Nativos( 6 Cristãos e 4 Mouros), e 2 Asiáticos( 1 Cristão, outro Mouro).
Dos 16 alunos saídos: 14 eram Nativos( 9 Cristãos e 5 Mouros) e 2 Asiáticos( 1 Cristão e 1 Mouro).

Movimento de alunos segundo suas proveniências, etnias e religião, em 30.6.1858:

-Da cidade de Moçambique, num total de 47 alunos: 4 Europeus, 27 Cristão Nativos, 16 Mouros e Árabes Nativos;

-De Inhambane, num total 4 alunos: 2 Cristãos Nativos e 2 Mouros e Árabes Nativos;

-De Sofala, num total de 3 alunos: 3 Cristãos Nativos;

-De Sena, num total de 1 aluno: 1 Cristão Nativo;

-Da ilha do Ibo, num total de 2 alunos: 1 Cristão Nativo e 1 Mouro Nativo;

-De Damão, num total de 2 alunos: 2 Mouros e Árabes Asiáticos;

-De Diu, num total de 1 aluno: 1 Gentio e Parse Asiático.

TOTAL: 60 alunos, sendo, 4 Europeus, 34 Cristãos Nativos, 19 Mouros e Árabes Nativos, 1 Gentio e Parse Asiático, 2 Mouros e Árabes Asiáticos.

Caracterização dos alunos
1857-2º Sem

Nada referenciado

1858-1º Sem.

Os alunos são de diferentes gerações e religiões, que existem e concorreram a Moçambique, (...) Neste número de alunos que frequentaram a Escola, incluem-se estudantes de todos os portos da Província e até dos portos da Ásia, com quem Moçambique está em relação.

Área de influência
1857-2º Sem

Esta Escola, não é somente a Escola da Cidade como alguns, erradamente, julgam. E o título que tem de Escola Principal de Instrução Primária da Província de Moçambique, cabe-lhe. completamente, porque, além dos alunos da Cidade, que a frequentam, tem-nos, e tem-nos tido sempre, da Cabaceira Grande, Pequena e Mossuril, e mesmo alguns lhe vêm dos Distritos do interior. Recebe e instrui, regularmente, discípulos de todos os Distritos da Província que lhe vêm enviados nas monções: Lourenço Marques, Inhambane, Sofala, Quelimane e Ibo, que têm dado sofrível contingente à Escola.
E apesar de haver Escolas nos Portos pode dizer-se que é a Escola Geral da Província.
Os portos da Índia, também lhe têm enviado bom número de alunos, especialmente Damão e Diu, donde, ordi­nariamente, lhe vêem alguns em todas as monções.
Final­mente, Mascate, Zanzibar e Anjoanes também têm enviado a esta Escola, por diferentes vezes, alunos.

1858-1º Sem.

A Escola não é somente a Escola da Cidade de Moçambique, como muita gente erradamente julga. É por assim dizer a Escola Geral da Província, porque tem sempre matriculado estudantes de todos os mencionados portos. E, ainda, conta, no número dos seus alunos, além dos discípulos da Cidade e seu termo, estudantes de Inhambane, Sofala, Quelimane e Sena, Ibo, Damão e Diu, apesar de haver escolas nesses portos. (...).

Destino profissional dos alunos saídos
1857-2º Sem

Nada referenciado

1858-1º Sem.

Dos 16 alunos saídos da Escola durante o mencionado semestre:

- um foi empregado, em praticante da farmácia, na Botica do Hospital;
- um está empregado na Repartição de Fazenda;
- três em escriturações particulares;
- três regressaram às suas famílias nos portos, sofrivelmente, desenvolvidos e instruídos;
- três foram entregues às suas famílias como incapazes de aprender coisa alguma, por excessiva rudez;
- quatro foram riscados da Escola como incorrigíveis, por sua irregular conduta e por não comparecerem quase, nem terem sujeição alguma às suas famílias e porque o seu exemplo era pernicioso para os mais alunos;
- um foi para Lisboa na barca Charles & George em companhia de seu pai.

1) - Prof. Univ. e Antropólogo.
(CONTINUA)

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